Esperei e esperei, mas
esse filme acabou nem sendo lançado comercialmente em Recife. O jeito foi
correr atrás dos torrents, uma pena, esse filme merece ser visto na tela
grande. Lançado no mesmo ano que o ótimo Os Suspeitos, O Homem Duplicado é
outra prova do talento do canadense Denis Villeneuve.
Ainda trabalhando sob a
roupagem do gênero suspense, Villeneuve cria uma narrativa distorcida,
sufocante e carregada de bons simbolismos. Adam (Jake Gyllenhall) é um
professor de história entediado que divide seu tempo fazendo sexo monótono com sua
namorada e se dedicando a vida acadêmica. Após assistir a um filme, Adam
percebe que é fisicamente idêntico a um dos atores, passando a ficar obcecado
em encontra-lo.
Adaptação de uma obra
de José Saramago, O Homem Duplicado é o mash-up perfeito entre Cidade
dos Sonhos e Sob a Pele ( http://blowupnow.blogspot.com.br/2014/05/sob-pele.html ). Ao filme de Lynch ele se assemelha por possuir passagens oníricas, e pelas
obsessões sexuais. Enquanto que no filme de Glazer, existe a mesma
estranheza com o qual o indivíduo olha para si. Porém, são apenas pontos em
comum, O Homem Duplicado tem bastante força para ser merecedor de
seus próprios méritos. Uma intensa dissecação do homem e de suas repreensões, e
como sua humanidade está sendo constantemente robotizada pela sociedade. O
filme confunde em seus tons amarelados e cria um quebra-cabeça intrigante,
conseguindo, ainda, desenvolver o emocional de seus personagens de maneira
exemplar.
As angustias de Adam são, melhor,
materializadas pelas personagens femininas. Aqui, o filme brilha. Se Adam
carece de humanidade ao fazer sexo, Anthony (seu duplo) não vê a hora de fugir
da paternidade e de seu matrimonio. O Homem Duplicado tem seus melhores
momentos no relacionamento amoroso infernal que Anthony possui com sua cônjuge.
A obra é corajosa o bastante para sair do confronto inicial (Adam e
Anthony) e desenvolver seus protagonistas através de suas parceiras. Fazendo
com que o filme tenha o ritmo de um sonho (ou pesadelo) carregado de
sexualidade reprimida.
Esse pesadelo ainda
possui um “que” de grotesco. Esse flerte se inicia na sequência inicial e
pontua toda a narrativa. Não se trata de algo berrante, mas sutil, imergindo o
filme em um estado de paranoia constante sobre o que nos aguarda no próximo
plano. O terror é trabalhado de forma que seja sempre associado com a psique do
protagonista. Existem poucos fatores externos, o filme é meticuloso e obsessivo
em exprimir o interior de seu protagonista. Por isso sua materialidade é
distorcida e seus sons, estridentes. E é dai que vem o suspense, do confronto
entre o material e imaterial, das dimensões do real e do imaginário que rodeiam
o protagonista, e do confronto com seu “sósia”.
As peças do
quebra-cabeça vão se tornando mais claras quando o filme começa a alternar mais
rapidamente entre Adam e Anthony. Mesmo sem concretizar que eles são a mesma
pessoa, o filme é eficaz em mesclar ambos no fluxo de consciência que é o
trecho final, fazendo com que o anseio por conclusões seja ainda maior. De
certa forma, o filme entrega as respostas, porém ele seria falho se as
entregasse de formas não imagéticas. Então, existe o fechamento do
quebra-cabeça, ele só foi diferente para cada um, pois as peças encontradas
variam para cada espectador, e encontra-las foi uma experiência extremamente
recompensadora.
Reafirmo a importância que a sala de cinema teria em uma narrativa dessas. Mesmo estando na atmosfera do filme, não parava de imaginar como seria infinitamente melhor está imerso na sala escura com a projeção em tela grande. Do contraste da luz da tela com a escuridão da sala, O Homem Duplicado seria melhor visto como é: Uma obra que retira nossos medos da escuridão e as projeta sob o foco da luz.
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