quarta-feira, 28 de maio de 2014

Shoah


Seja pela sua duração, quase dez horas, ou por sua abordagem do maior acontecimento do século passado, Shoah é um caso a parte dentro da história do cinema. O filme de Claude Lanzmann é obsessivo, intrigante e perseguido pelo passado. Munido apenas de depoimentos, Shoah é uma obra assombrada, que chega perto de entender o absurdo, o assassinato de mais de seis milhões de judeus durante a segunda guerra mundial.



Excluindo totalmente o uso de imagens de arquivo, o filme procura rostos, ganhando dimensões épicas nos enquadramentos (imagino como deve ser assistir em tela grande), frutos de quase dez anos de entrevistas. Sabiamente, o filme fornece uma variedade impressionante de depoimentos: Motoristas dos tais “trens da morte”, coveiros dos campos, cabeleireiros dos prisioneiros dos campos, oficiais do alto escalão nazista, lideres da resistência judaica, moradores das cidades próximas aos campos, dentre vários outros. Todos eles com tempos satisfatórios de depoimentos. Lanzmann também vai aos tais campos, ele leva seus entrevistados aos locais, refazendo seus trajetos originais. Sob o risco de cair no sentimentalismo barato, a narrativa se apresenta eficaz em evitar a comoção fácil do público, preferindo uma abordagem mais reflexiva sobre as consequências do genocídio. O inconformismo de seu diretor é o que impulsiona o filme, sua vontade de exibir esses rostos e a busca pelas estórias é apenas o gancho para ir além e encontrar algo racional em um pedaço da nossa história completamente irracional.


Atesto que a história nunca havia se mostrado interessada em contar a história feia das vítimas das guerras, pelo menos até o fim da segunda guerra mundial. Portanto um filme como Shoah é um artefato histórico de grande valor. Sabendo disso, Lanzmann faz de seu filme o meio para encontrar e dar espaço a vozes que estavam silenciadas. A sombra do passado é sempre evidenciada pelos planos contemplativos dos campos abandonados, onde a câmera subjetiva se torna uma alma passeando pelo purgatório. O uso da arquitetura é fascinante, os prédios, mais parecem vindos de outro mundo do que com os descritos pelos personagens. A ferrugem e a decadência deles se tornam a analogia perfeita sobre a dificuldade em se enterrar o passado.

Shoah também se revela como uma análise do passado na construção do presente: Onde a maquina nazista se mostra tão eficaz em matar e em esconder seus crimes, que o filme parece questionar se ela sumiu por completo ou se apenas se misturou a sociedade de forma sutil. Esse ponto é ressaltado por diversas entrevistas, onde personagens parecem encenar que conheciam pouco sobre o que acontecia nos campos ou aparentam não acreditar nas histórias das vitimas contadas por Lanzmann. Para tornar esses embates ainda mais evidentes, o filme joga bastante com o uso da narração em off dos personagens sob as paisagens desérticas dos campos abandonados. Em outros momentos, o próprio diretor, não se controla e em momentos de irritação, interfere no rumo das entrevistas. Mesmo com essa interferência no dispositivo, Shoah não é preso às opiniões de seu diretor. Em vez disso, ele aceita que seu tema nunca poderá ser totalmente compreendido pelos olhos daqueles que não estavam lá e com os mesmos trens que levaram milhares a morte, o filme se conclui.


Shoah é um trabalho primoroso e arrebatador acerca do horror. Meditativo na medida certa, assistir ao filme (Seja no computador ou no cinema) representa uma vitória para seu diretor e um triunfo humano ainda maior.


3 comentários:

  1. Não consegui achar o filme para assistir, nem dublado ou legendado. Você sabe me dizer onde assistir (já que para fazer download é muito longo) ? Obrigado.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Laerte, só conheço opções de torrent (com legenda em pt) para o filme :x

      Excluir
    2. Olá! Consegui baixar o filme numa versão de 2CDs, porém as (poucas) legendas que encontro em português são para versões em 4 ou 8 CDs. Sabe onde eu poderia conseguir a legenda em 2CDs ?

      Obrigada!

      Excluir