terça-feira, 12 de agosto de 2014

O Homem Duplicado


Esperei e esperei, mas esse filme acabou nem sendo lançado comercialmente em Recife. O jeito foi correr atrás dos torrents, uma pena, esse filme merece ser visto na tela grande. Lançado no mesmo ano que o ótimo Os Suspeitos, O Homem Duplicado é outra prova do talento do canadense Denis Villeneuve.

Ainda trabalhando sob a roupagem do gênero suspense, Villeneuve cria uma narrativa distorcida, sufocante e carregada de bons simbolismos. Adam (Jake Gyllenhall) é um professor de história entediado que divide seu tempo fazendo sexo monótono com sua namorada e se dedicando a vida acadêmica. Após assistir a um filme, Adam percebe que é fisicamente idêntico a um dos atores, passando a ficar obcecado em encontra-lo.

Adaptação de uma obra de José Saramago, O Homem Duplicado é o mash-up perfeito entre Cidade dos Sonhos e Sob a Pele ( http://blowupnow.blogspot.com.br/2014/05/sob-pele.html ). Ao filme de Lynch ele se assemelha por possuir passagens oníricas, e pelas obsessões sexuais. Enquanto que no filme de Glazer, existe a mesma estranheza com o qual o indivíduo olha para si. Porém, são apenas pontos em comum, O Homem Duplicado tem bastante força para ser merecedor de seus próprios méritos. Uma intensa dissecação do homem e de suas repreensões, e como sua humanidade está sendo constantemente robotizada pela sociedade. O filme confunde em seus tons amarelados e cria um quebra-cabeça intrigante, conseguindo, ainda, desenvolver o emocional de seus personagens de maneira exemplar.

 As angustias de Adam são, melhor, materializadas pelas personagens femininas. Aqui, o filme brilha. Se Adam carece de humanidade ao fazer sexo, Anthony (seu duplo) não vê a hora de fugir da paternidade e de seu matrimonio. O Homem Duplicado tem seus melhores momentos no relacionamento amoroso infernal que Anthony possui com sua cônjuge. A obra é corajosa o bastante para sair do confronto inicial (Adam e Anthony) e desenvolver seus protagonistas através de suas parceiras. Fazendo com que o filme tenha o ritmo de um sonho (ou pesadelo) carregado de sexualidade reprimida.

Esse pesadelo ainda possui um “que” de grotesco. Esse flerte se inicia na sequência inicial e pontua toda a narrativa. Não se trata de algo berrante, mas sutil, imergindo o filme em um estado de paranoia constante sobre o que nos aguarda no próximo plano. O terror é trabalhado de forma que seja sempre associado com a psique do protagonista. Existem poucos fatores externos, o filme é meticuloso e obsessivo em exprimir o interior de seu protagonista. Por isso sua materialidade é distorcida e seus sons, estridentes. E é dai que vem o suspense, do confronto entre o material e imaterial, das dimensões do real e do imaginário que rodeiam o protagonista, e do confronto com seu “sósia”. 


As peças do quebra-cabeça vão se tornando mais claras quando o filme começa a alternar mais rapidamente entre Adam e Anthony. Mesmo sem concretizar que eles são a mesma pessoa, o filme é eficaz em mesclar ambos no fluxo de consciência que é o trecho final, fazendo com que o anseio por conclusões seja ainda maior. De certa forma, o filme entrega as respostas, porém ele seria falho se as entregasse de formas não imagéticas. Então, existe o fechamento do quebra-cabeça, ele só foi diferente para cada um, pois as peças encontradas variam para cada espectador, e encontra-las foi uma experiência extremamente recompensadora.

 Reafirmo a importância que a sala de cinema teria em uma narrativa dessas. Mesmo estando na atmosfera do filme, não parava de imaginar como seria infinitamente melhor está imerso na sala escura com a projeção em tela grande. Do contraste da luz da tela com a escuridão da sala, O Homem Duplicado seria melhor visto como é: Uma obra que retira nossos medos da escuridão e as projeta sob o foco da luz.

Link IMDB: http://www.imdb.com/title/tt2316411/

  Música para acompanhar:

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